segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

2020: Um ano todo de sexta- feira 13

 

Eu acordei no dia 1 e senti um arrependimento danado pela noite passada. Acordei sozinha, na casa que não era a minha, com lembranças turvas de uma noite bem “bebida”. 

Lavei o rosto e desci para enfrentar outros rostos. 

Não sabia ainda o quanto de saudade sentiria desses rostos.  Três meses depois nós estávamos separados por tempo indeterminado, eu na minha e todos nas suas casas.

Um medo danado do desconhecido me fazia caminhar pelos ambientes sentindo estar sendo vigiada por olhos menos que minúsculos.

Eu me armei com álcool e pus a limpar todas as superfícies, o álcool que me fez sentir tão suja na manhã do dia 1.

Álcool de limpar. Álcool de beber.

Limpa a superfície, mas não elimina a vergonha na cara.

Vergonha de quem não sabe se controlar, mas quer controlar tudo e todos até o minúsculo do minúsculo.

E o tempo tem passado, entre vergonhas minhas e alheias.

Nesta semana, por exemplo, fui pegar o lixo para colocar fora de casa e encontrei um amontoado de insetos.

Estavam todos juntinhos, talvez planejando um motim, uma fuga ou ataque. Eu fiquei olhando para eles, por quanto tempo? Não sei.

Só pensava no que aqueles amontoados poderiam me causar: dor? Incômodo? Trabalho? Chato?

Eles eram pretinhos e tinham antenas vermelhas, pequenos, amontoados ao lado do lixo. Para onde seguiriam depois?

Peguei o spray que mata barata e joguei neles até deixá-los brancos, pensei que morreriam em paz, mas os bichinhos estranhos começaram a pular.

Eu me assustei. Eu me enganei. Saí pisando neles pelo corredor, mas eram tantos. Eu esmagava um e surgia outro.

Eles estavam fugindo de mim.

Eu, a maiúscula, a grande e feia assassina que estava na superfície perigosa. Eu preciso ser controlada, um spray anti- Daniela?

Estou no banho, tentando lavar as minhas lágrimas.

2020 foi ano de morrer e não aprendi a deixar de matar.

Olho para o chuveiro e acima dele eu vejo uma aranha bem paradinha, como se estivesse congelada, no controle do tempo.

Ela deve estar esperando eu sair do banho para continuar com a sua vida.

Será que ela sente medo de mim? Eu teria porque já estou pensando em matá-la, posso espremê-la com os dedos.

Ela é pequena e não é páreo para mim. Quem manda fazer teias e me prender entre elas?

Quem a autorizou entrar na minha casa e invadir meus pensamentos durante o banho?

E quanto mais eu penso, mais sinto a vontade crescer dentro de mim.

2020 foi ano de morrer e não aprendi a deixar de matar.

Coloco para tocar o novo disco do Emicida e ouço: “Tudo, tudo, tudo que nós tem é nós. Tudo que nós temos é um ao outro”.

Desligo. Um pensamento me acolhe: Um vírus mortal é meu nós.

Eu miro de frente a minha fragilidade, vejo a vida passar num instante e não sei quanto tempo tenho para viver.

“Não há quem segure o dia de amanhã nas mãos”.

Se tudo vai acabar, qual é a razão para acreditar que vale a pena enfrentar as sextas- feiras 13?

Enquanto escrevo busco a reparação e substituo a palavra amor pelo verbo amar:

Amar- atitude. Amar- espiritual. Amar- poesia. Amar- perdão.

Amar o meu nó. Desatar o meu nó.

Do nó sai o laço.

Abro os meus braços e coloco você no meu abraço.

2021

 

 

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