Após um
período de trevas, marcado por grande ansiedade, finalmente, no início do ano,
veio à tão aguardada notícia: Minha filha foi aprovada no vestibular.
Nossa... que
alegria, que felicidade...
Choramos e
rimos juntas. Ligamos para todos da família para dar a notícia e, por alguns
dias, respondemos às mensagens dos amigos agradecendo pela torcida, confiança e
sei lá mais o que.
Nas
primeiras horas, eu não tinha percebido o quanto essa notícia alteraria as
nossas vidas.
Aliás,
foram tantas decisões que tivemos que tomar que mal tem sobrado tempo para
conversamos sobre como será a nossa vida daqui pra frente.
Eu sei que
ela está um pouco assustada, em alguns momentos já confidenciou que não sabe se
está tomando a decisão certa, tanto com relação ao curso quanto a ir morar em
uma cidade distante, onde não conhece ninguém.
Nem sempre
tem sido fácil manter o otimismo para incentivá-la a seguir em frente. Como a adulta
desta relação, não posso fingir que a vida não seja um risco e que pra ser
feliz precisamos arriscar de vez em quando, não é?
Mas, já tiveram dias em que eu falei para ela não ir, para ficar um pouco mais em casa, comigo,
se não tem certeza do que quer.
– Faz um cursinho, que tal uma viagem de
autoconhecimento?
Sempre que
isso acontecia, era como se ela recebesse um novo fôlego e teimosa decidisse seguir
em frente com seus planos, sua vida.
Depois foi
a vez de sair à procura de uma casa para ela morar. Nós vistamos tantos e
tantos apartamentos, uma verdadeira maratona. Uns eram escuros demais e outros
destruídos demais.
- Mãe, só
quero um apartamento iluminado. Não precisa ser grande e nem bonito. Só precisa
ter luz.
Como negar
isso a ela? Luz?
Mas,
engana-se quem pensa que isso é fácil encontrar em uma kitnet no centro de uma
cidade grande. Quem já foi procurar, sabe bem o que estou falando.
Nós
vistamos dezenas de imóveis até que encontramos.
Ficamos tão felizes!
Saímos dali e fomos direto comprar coisinhas para a casa dela. Tapete, quadros,
panelas, escorredor de pratos...
Claro, que
isso é o de menos. Mas, assim foi. Aos poucos nós fomos nos acostumando com a ideia
até chegar a geladeira, fogão e perceber que não tinha mais volta.
Mas, agora,
falta pouco. Na próxima semana, a minha filha começa a universidade.
Não posso
mais ignorar que ela terá uma nova casa, novos amigos, que eu provavelmente não
conhecerei, enfim, uma vida longe de mim.
No começo,
talvez, ela ainda precise de um tempo para se equilibrar, conquistar confiança,
mas logo vai ganhar fôlego e seguir o seu destino.
Por mais
que eu me preocupe, sei que cada um constrói sozinho a sua história, a partir
das suas decisões, de suas escolhas.
Quando os
filhos são pequenos, os pais decidem por eles. Quando crescem, temos que
confiar que conseguirão tomar suas próprias decisões.
Ninguém
pode ser protagonista da vida de outra pessoa. Até mesmo os pais, em certo
momento, precisam se contentar em ser coadjuvantes.
Mesmo
porque nós, pais, não viveremos para sempre.
Quanto mais
tempo os filhos demoram a seguir o seu caminho e aprendem a fazer suas próprias
escolhas, mais aumenta a chance de que se tornem dependentes e sofram a nossa falta.
Eu não
quero isso.
Quero uma filha independente e que continue a ser feliz apesar
do que possa acontecer comigo no futuro.
Eu sempre
tive muito claro que a vida é transitória, sei que estamos de passagem e que o
elo que nos une é o amor verdadeiro, como o amor que sentimos uma pela outra.
A partida
da minha filha para a faculdade é o início de uma corrida de passagem de bastão.
Estou
entregando a ela o direito que é dela: de viver a própria vida. Ser feliz,
independente de mim.
Ela ainda
não se conhece muito bem, mas longe de mim terá essa oportunidade.
Em sua
casa, fará as coisas do seu jeito. Não será obrigada a comer salada ou feijão,
já que não terá a mãe para obriga-la.
Mas, por
outro lado, quem sabe ela descubra que gosta dessas comidas mais do que
imaginou?
Ou que gostava
muito de quando eu a perturbava para comer essas coisas e mais ainda da minha
cara contrariada quando ela se negava a experimentar?
Mas, o fato
é que daqui pra frente ela fará as suas escolhas.
Já avisei a
ela que suas escolhas sempre terão um impacto em mim, bom ou ruim. Para que, se
for possível, lembre-se disso. Não maltrate muito o meu coração.
Será tolice
pedir isso? Talvez, talvez...
Mas, pense:
o que mais posso fazer neste momento?
Eu só posso
ficar aqui, onde estou agora, observando e torcendo para que a vida seja boa
com ela.
Tão boa
quanto foi comigo quando a colocou em minha vida.
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