Três anos escrevendo todos os dias para perder tudo!
Ele me olhava com a expressão de quem ainda não tinha se
conformado com a situação, mesmo sabendo que seria impossível recuperar o
material.
Durante todos aqueles anos, diariamente, sistematicamente, o
rapaz tinha escrito poesias. E quem escreve poesia sabe que não é algo que se
faça sem esgarçar o coração.
Enquanto ele me contava o que tinha acontecido, fiquei
imaginando o seu desespero ao ver todas as suas emoções expressas sendo
engolidas por um computador sem compaixão.
Então, ele me perguntou: - O que você acha que eu devo fazer
agora?
Isso aconteceu após a palestra que eu dei na Faculdade Unip,
de São José dos Campos, onde fui convidada para falar sobre Crônicas.
O rapaz que me refiro assistiu toda a apresentação e não fez
nenhum pergunta, ficou quieto no fundo da sala, mas no final me procurou para
contar sobre o que tinha lhe acontecido.
Puxa, o que eu faria? Pensei.
Eu passo horas pensando, trabalhando, cuidando, lapidando as
palavras e quando o texto finalmente está pronto para ser publicado é quase como
parir um filho.
Existe muito do que eu sou em cada palavra, quando publico para
que o texto seja lido por outros faço isso com afeto, insegurança (será que
está pronto?) e saudades do tempo em que era só meu.
Então, senti a dor dele. Poesia não é crônica. Crônica é um
olhar para o cotidiano, calma e aconchego. O dia a dia visto com amor e
carinho.
Poesia é instante, paixão, dor extrema. Poesia é
intensidade. E esse tipo de coisa não dá para reproduzir duas vezes sem perder
a essência.
O que eu podia dizer ao poeta?
Pedi que continuasse a escrever e colocasse em palavras a
dor que estava sentindo. A morte inesperada das suas poesias pode servir como
inspiração para uma nova fase em seu trabalho.
Quem sabe não é o destino testando sua vontade ou apenas o
protegendo de divulgar poesias que ainda não estavam prontas?
Espero um dia ler as poesias deste rapaz, quem sabe...
Quero acreditar que ele saiu da palestra, animado para escrever,
revisitar alguns sentimentos e abrir novamente o seu coração com a consciência de
que tudo pode desaparecer num sopro.
A perda nos faz sentir com mais profundidade, quando não
mata as nossas esperanças.
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